Omar Talih


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segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Com a boca na Botija...

Quando servi ao exército em 1975, era um "laranjeira", soldado que passa a maior parte do mês no quartel por morar distante ou outro motivo qualquer. Estávamos no auge da ditadura e fazia pouco que a guerrilha armada havia sido vencida. A guerra do Viet Nan mal acabara e o movimento hippie era forte . Os negros americanos lutavam contra o racismo com o movimento Black Power e havia adeptos mundo afora. Antes de me alistar, fui hippie e Black, ostentando uma cabeleira que fazia meu rosto sumir. Era uma época de muito machismo, lutas livres e fazer artes marciais era o sonho da juventude. O exército era um lugar de homens e machos. Não se admitia mulheres ou homossexuais em suas fileiras. As forças armadas sempre foram conservadora e moralista, embora haja ali mais homossexuais do que nos é permitido saber. Mas isto não é o assunto do momento. Durante meu tempo de caserna, tive um oficial que era descaradamente gay e todos sabiam, desde o comandante até o mais raso dos soldados. Era tão visível sua preferência que ele foi 'suspenso' de alguns exercícios que deveria ministrar a tropa. Havia também um soldado que tinha entrado na mesma época que eu e estava fazendo o curso de 'Cabo'. É o início da carreira para quem quer seguir nas armas. Ele queria que os outros soldados o respeitassem como superior e por isso me perseguia, pois jamais o tratei como tal. Um dia cheguei pela tardinha, depois de um dia de folga, estava escalado para o serviço de sentinela no outro dia e, havia um grande alvoroço no quartel. O oficial do dia me chamou para auxilia-lo nos procedimentos e perguntou se eu estava no meio da confusão. Não senhor!, foi minha resposta sem saber do ocorrido. Então, conversando com outro soldado, soube dos fatos: Tudo começou com alguns soldados detidos por alguma transgressão as normas estabelecidas. Eles não teriam folga de final de semana e permaneceriam no quartel até 2ª feira a tarde, aqueles que moravam na cidade, os laranjeiras só sairiam no próximo final de semana. Para compensar o tédio da detenção, resolveram comprar pinga, limão e açúcar e fazer uma festinha, embora fosse proibido, não teria problemas. Foi o que pensou o sargento do dia, fazendo vistas grossas. No auge da bebedeira, o soldado que fazia curso de 'Cabo' ficou eufórico e arrumou um parceiro. Foram para o fundo do alojamento e se atracaram. A gritaria e gemedeira foi enorme e os outros foram ver o que se passava. O futuro 'Cabo' tinha outro soldado grudado e fungando no seu cangote. Deu desespero geral. Ninguém sabia o que fazer. Chamaram o sargento que chamou o tenente oficial do dia, que ordenou que fossem encaminhados presos. A notícia correu feito fogo em pólvora e depois de três meses de processo, ambos foram expulsos do exército. Tinha também um sargento que era admirado por todos. Ele tinha o porte físico do Daniel Greic, o James Bond; louro, olhos verdes, voz grossa e massa muscular que causava inveja na rapaziada. Quando ele dava instruções, a atenção era total. Mas, durante o tempo de serviço, a maioria dos soldados estão sempre duros, ganham pouco e quase sempre gastam o que tem com prostitutas e outros programas desaconselháveis. Porém, um, embora fosse laranjeira e de família humilde, estava sempre com dinheiro e dificilmente estava de serviço nas sextas feiras. Um dia, voltávamos da farra para o quartel por volta de 23 horas e vimos um carro parado a uns 500 metros do portão das armas. Estávamos em dez mais ou menos e por curiosidade em saber se era um casal transando, cercamos o carro para ver seu interior. Naquele tempo não se usava filmes nos vidros. Os ocupantes estavam tão envolvidos no ato que não perceberam nossa aproximação. Nos dividimos em dois grupos e cada um foi por um lado. Ao olharmos pelo vidro embassado, vimos o sargento com a "boca na botija" e entendemos porque aquele soldado sempre tinha dinheiro. Ao nos ver, o sargento engoliu o que tinha na boca e abriu a porta do carro, mas já estávamos correndo em direção ao quartel morrendo de rir. A partir daquele dia, as instruções do sargento já não despertava tanto interesse e embora jurássemos que nada havíamos falado, o quartel inteiro tomou conhecimento do fato. Depois disso, aquela unidade ficou conhecida como "Nosso Cantinho", alusão a um bar de homossexuais existente na cidade.

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