Omar Talih


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quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Coisas da Ditadura

Vendo em um jornal televisivo, uma reportagem sobre um novo equipamento para verificação de passageiros nos aeroportos de Londes, lembrei-me de um episódio que ocorreu comigo pelos idos de 1982,
quando a ditadura no Brasil ainda era forte e todos que trabalhavam para o estado, se sentiam superiores a reles cidadãos como eu.
Bom, o fato é que nessa época, tinha um bar no centro da cidade, onde eu trabalhava por 12 ou mais horas todos os dias. Havia nas proximidade, muitas lojas, quase todas de libaneses ou chineses, pessoas muito trabalhadoras e gentis. Em uma delas, trabalhava uma garota que embora noiva, vinha todos os dias me ver no trabalho e jogar um pouco de conversa fora, na hora do almoço. Era apenas uma paquera sem maiores consequencias (Em 1982?). Numa segunda feira, ela apareceu no bar, toda queimada de sol e andando como um "robo". Tinha passado o final de semana em Santos. Praia Grande era o destino de todo interiorano que se aventurava ao litoral. Eu tinha uma maquina fotografica que para a época já estava ultrapassada, mas ainda a usava para fotografar. Comecei a fotografa-la na calçada em frente ao bar. Foram apenas algumas chapas. Nos divertimos um pouco e voltamos a nossos afazeres.
Algumas horas mais tarde, surge na porta do bar uma viatura da Guarda Municipal com vários guardas e dois homens espumando de raiva.
__ É aquele ali. Disse apontando em minha direção.
Um dos guardas vem até mim e diz;
__ Voce esta preso. Pegue a maquina fotografica que voce estava usando e venha omigo.
Não entendi nada. Ninguém entendeu. O comercio parou para ver o que se passava.
Peguei o objeto que estava me levando a prisão e o segui.
__ Procure o Dr. Tarcísio, disse aos meus amigos que não sabiam o que fazer.__ Vou para o 1º Distrito.
Era para lá que levavam todos os presos da cidade. A notícia correu como fogo em polvora.
Antes de ser levado para a delegacia, passei pelo quartel da guarda. Um comandante, tenente Barbosa, me aguardava.
__ É este o sujeito? Perguntou sem me olhar.
Antes de receber a resposta, voltou-se para mim e apontando o dedo em riste:
__ Eu vou acabar com voce, marginal.
Os dois homens que acompanhavam os guardas, eram o pai e o noivo da garota fotografada.
__ É ele que estava fotografando minha filha com uma dessas maquinas modernas que tiram a foto de roupa e a pessoa aparece nua.
O incrível é que naquela época não havia sequer camera digitais, celulares e internet.
Depois de muita ameaça e uma ficha quilometrica, fui levado a presença do delegado. Não me lembro do nome dele.
O pai da moça, descreveu o fato ao delegado e olhando para mim:
__ Quero esse... sujeito na cadeia.
Pacientemente o delegado, que já havia recebido um telefonema de advogado, dirigiu-se a mim.
Pediu a maquina e a examinou.
__ É apenas uma maquina comum.
__ Quero esse sujeito na cadeia! Esbravejou o pai da moça.
__ Bem, falou o sensato delegado, não posso prende-lo. Não há crime em fotografar pessoas na rua.Senão, teria que prender todos os jornalistas da cidade.
__ Mas ele não pode ficar impune!
Então, o delegado pegou a maquina, abriu-a e retirou o filme danificando-o.
Pegou uma tesoura e picotou-o todo.
__ É o máximo que posso fazer! Esta bem, podem voltar a seus afazeres.
É claro que não deixou todo mundo feliz, mas me senti aliviado.
De volta ao bar, de repente apareceu gente de todos os lados para saber o que havia acontecido. O bom do negócio é, que ninguém ficou sem gastar um pouco e assim, o faturamento foi ótimo.Naturalmente que depois disso,queriam que eu arrumasse uma encrenca de vez em quando.
Fico aqui pensando com meus botões: Como é polemica essa nova tecnologia e perigosa... por causa dela, fui preso 30 anos antes de ser inventada.

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